Magistrado que usou nome falso: consequências para o Direito Administrativo – *Alexandre Mazza, advogado administrativista

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O recente caso do juiz José Eduardo Franco dos Reis, que utilizou nome falso durante toda a sua carreira, tem movimentado a imprensa e o meio jurídico. A principal discussão gira em torno de o que fazer com as milhares de decisões proferidas por ele em 23 anos de magistratura.

Haveria algum tipo de nulidade? Os eventuais prejudicados por suas decisões poderiam buscar a revisão judicial de seus atos?

Do ponto de vista do Direito Administrativo, o ato de investidura na magistratura tem um vício grave, porque se lastreou nos crimes de uso de documento falso e falsidade ideológica.

Em tese, quando o ato administrativo é praticado amparado em algum tipo de crime, aplica-se a teoria do ato juridicamente inexistente, que defende que vícios tão graves como esse não prescreveriam e poderiam se anulados a qualquer tempo, mesmo depois de passadas mais de duas décadas.

A adoção dessa teoria traria o caos, pois exigiria o desfazimento de todos os atos jurisdicionais que praticou, assim como de todos os atos administrativos diariamente realizados nas suas funções, como ordens ao pessoal da repartição, presidência de audiências e dezenas de atos administrativos que um juiz pratica diariamente. Pensar na anulação de todos os atos que praticou, em todos os processos que julgou, é assustador.

Ocorre que o caso tem que ser analisado com bom-senso à luz do princípio da segurança jurídica, que favorece a adoção de soluções que tragam uma pacificação social e a manutenção de situações já consolidadas.

Deve-se levar em conta que o magistrado cursou regularmente a faculdade de direito, diplomou-se e foi aprovado no concurso da magistratura, demonstrado preencher todos os requisitos para o exercício de suas funções. Não se trata, portanto, de um usurpador de função pública, de um lunático que enganou a todos e passou-se por juiz sem o ser, caso bizarro, aliás, que já aconteceu em nosso país.

Estou certo de que por conta do princípio da segurança jurídica as instâncias superiores do Poder Judiciário, chamadas a resolver essa grave situação, irão manter todos os atos que esse magistrado praticou, bem como a remuneração que recebeu e vai receber, evitando assim o cenário caótico de milhares de anulações.

Muito mais grave seria a situação se a Universidade de São Paulo decidisse, como se vem especulando, cassar o seu diploma, porque aí faltaria um requisito indispensável para ser válida sua nomeação como juiz. Nesse caso, seria inevitável desconstituir todos os milhares de atos decisórios que praticou, com consequências práticas inimagináveis.

*Alexandre Mazza é advogado administrativista

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